A proximidade das eleições municipais e a discussão global sobre os impactos futuros da inteligência artificial (IA) devem fazer o presidente da Câmara, Arthur Lira, pautar a regulamentação após o recesso parlamentar. A Free Minds apurou que Lira pediu um levantamento detalhado de projetos de lei em tramitação sobre IA e deve receber o detalhamento das iniciativas parlamentares nos últimos dias de janeiro.
A missão de reunir as propostas legislativas foi dada à deputada Luísa Canziani (PSD-PR), que é ligada a temas da Economia Digital e foi relatora do PL 21/2020, aprovado no final de 2021, com “fundamentos e princípios para o desenvolvimento e a aplicação da inteligência artificial no Brasil”.
A partir da apuração das propostas, a deputada deve se reunir com o presidente na próxima semana para definir com ele como será a função dela como relatora de um novo texto de lei a ser elaborado a partir dos projetos existentes. Lira pretende dar um ritmo acelerado ao tema para aprová-lo de olho no mercado e nas eleições municipais de outubro.
O presidente quer que a Câmara tenha voz decisiva sobre o desenvolvimento e o uso da IA no país. Mas ele deve tomar cuidado, conforme apurou a Free Minds, para não se chocar com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que elaborou o projeto de 2.338/2023. Não é praxe presidentes do Legislativo apresentarem projetos. Mas Pacheco chamou para si a regulamentação, após encomendar um compilado de sugestões a juristas liderados pelo ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O grupo elaborou um relatório de 900 páginas, posteriormente usado como base do PL 2.338, cuja relatoria está com o senador Eduardo Gomes (PL-TO) em uma comissão especial criada no Senado para apreciar a matéria.
A intenção de Lira é abrir um diálogo com Pacheco para acelerar o marco regulatório da IA. O líder da Câmara deve propor um acordo a seu par no Senado, com o compromisso do texto final do marco legal ser a combinação dos projetos aprovados nas duas Casas do Legislativo. Ou seja, sem a sobreposição de um sobre o outro – como tem ocorrido em outros temas.
O caminho pacífico é visto como necessário para evitar que o Senado deixe a iniciativa da Câmara dormitando em suas gavetas. A união das duas Casas também representaria força para frear a eventual pressão do lobby empresarial contrário a possíveis pontos polêmicos da regulação.
Mira eleitoral
Lira também pretende aproveitar o novo projeto para incluir algumas das sugestões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apresentadas no ano passado para integrar o PL 2630/2020. Apelidado de PL das Fake News, a proposta esbarrou, de um lado, na pressão das plataformas digitais por maior participação na definição do marco legal sobre a publicação de conteúdos na internet e, de outro, na rejeição da Rede Globo à cobrança de direitos autorais nos serviços de streaming audiovisual previstos no PL 2370/2019, que absorveu parte da regulamentação das fake news.
Interlocutores de Lira dão como certo que o PL das Fake News não avançará em 2024. Em paralelo, a manobra de incluir a demanda do TSE num instrumento normativo da inteligência artificial seria uma sinalização de que a Câmara joga junto com a corte eleitoral.
Mais do que isso: passa a mensagem de que a Câmara está empenhada em salvaguardar a democracia. Para além do Judiciário, do ponto de vista retórico, a estratégia dialoga com setores da sociedade e da imprensa.
Plano B
Na avaliação da Free Minds, o avanço de Lira sobre a regulamentação da IA mostra que o presidente segue com olhar apurado para identificar temas de impacto para se posicionar como interlocutor com poder de decisão. Este será o último dos quatro anos de Lira no comando da Câmara, onde vai trabalhar para eleger seu sucessor e, com isso, manter-se próximo do poder para se cacifar como potencial candidato ao Senado por Alagoas em 2026.
Não será uma disputa fácil: o senador Renan Calheiros (MDB-AL) deve trabalhar fortemente para impedir a eleição do inimigo Lira. O chefe da Câmara sabe disso e, aos poucos, dá pistas de ter um plano B do chefe da Câmara: migrar para a iniciativa privada.
Não à toa, como já fez em diversas entrevistas, Lira cita como exitosa a manobra do ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia, que, após deixar o Legislativo, tornou-se lobista de peso da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF). A migração, contudo, depende como o atual presidente da Câmara conseguirá acomodar interesses do mercado – como o marco legal da IA, cujo impacto dentro de pouco tempo será em escala em todos os setores da economia.
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